sábado, maio 12, 2007

Sobre Jornalistas e palhaços

Na sexta-feira, 11 de maio, os funcionários do Diário da Manhã foram ao jornal vestidos de preto, em protesto contra três meses de salários atrasados. A direção anunciou a demissão de todos os que faziam parte do protesto. Houve quem implorasse para voltar, houve que desmentisse a participação. Houve quem, bravamente, manteve-se firme e forte. Estão desempregados hoje, mas certamente serão profissionais de futuro, porque a vida premia a ética e o bom caráter. A eles --e à memória dos desertores, fracos que se abraçaram a um emprego que não os paga-- dedico este texto. Mal escrito em um sábado de manhã, impregnado de personalismo e presunções idiotas. Mas peço que aceitem, é de coração:

Para início de conversa, Jornalista não é palhaço. Há repórteres que desempenham o papel com fervor e dedicação mas, a rigor, Jornalista não é palhaço. Tenho todo respeito pela profissão dos palhaços. E tento manter o respeito à profissão dos Jornalistas. Embora haja muitos jornalistas entre eles.

Mas, voltemos ao assunto, Jornalista não é palhaço, se não pelas roupas que veste –nunca vi palhaço de preto– pela função social de cada um. Ambos são importantes e, arrisco-me a dizer, imprescindíveis.

O palhaço vive para alegrar. Para tirar sorrisos de rostos distintos, para fazer rir os que choram, fazer chorar (de rir) os que já riem.

O Jornalista, não. Seu trabalho é dar à sociedade o contraponto às risadas. Nos segundos que sucedem ao riso, depois daquele "ai, ai" comum e que nos resgata à realidade –a dura e cruel realidade–, surge o papel do Jornalismo. Há um mundo que precisa (e pede) para ser mostrado. Há feridas abertas, ansiosas.

Não cabe a mim versar sobre o papel do Jornalista. Não sou a pessoa mais indicada para fazê-lo. Apesar de ser inconscientemente medíocre –ainda acho que posso mudar algo–, seria pretensioso falar em caminhos e descaminhos de uma profissão que mal conheço.

(Mal conheço, e não apenas porque estou há pouco tempo neste mundo. Mal conheço, isto sim, porque tomo como gerais valores que são apenas meus. Coisas que aprendi com professores longe dos bancos da universidade e próximos de mesas de bar e máquinas de escrever. Mas não existem mais as máquinas de escrever.)

Mas, como Jornalista, não me permito calar.

Não sou jornalista "por formação" como gostam de ostentar muitos coleguinhas. Formei-me, depois de cinco anos, na Universidade de Brasília. Tenho diploma de jornalismo, se é isso que quer dizer "por formação". Mas não foi a UnB que fez de mim um Jornalista. O que faz um Jornalista são as formigas, não a faculdade ou o diploma.

O Jornalista, e escrevo sempre em maiúsculas –ou "caixa alta", como queiram–, é aquele que tem formigas por todo o corpo e a mente. Aquele que fica inquieto, correndo atrás de idéias melhores dos que a que os colegas ao lado julgam geniais. Que corre atrás de idéias simples, também, porque é delas que se faz um jornal diário. O Jornalista deve cultivar suas formigas. E, seguro de suas capacidades, não precisa pendurar o diploma na parede.

O Jornalista não é palhaço, mas deveria aprender com eles. Aprender que, ao travestir-se em roupa colorida e colocar um nariz caricato, aquele ser humano tenta passar a seus iguais o mínimo de esperança. Há quem tenha dó de palhaços, dizendo que o trabalho os coloca no limite da dignidade. Discordo completamente.

O palhaço está pulando e fazendo caretas às 15h sob calor de 40 graus porque acha que, daquela forma, é útil à sociedade. Ganha pouco, quando ganha, mas faz seu trabalho. Diverte-se. É digno e exemplarmente altruísta –pode estar triste, mas busca a felicidade nos olhos de quem o vê.

O Jornalista sem formigas é como o palhaço sem graça. Esse tipo de jornalista –"caixa baixa", por favor– não questiona. Não luta pela informação que será mais útil a seu leitor. (Sim, senhoras e senhores! O leitor, alguém se lembra dele? Ou os jornalistas estão mais preocupados com outras coisas – inflar o próprio ego com furos e manchetes, por exemplo?)

O jornalista sem formigas é estéril, na concepção geológica. Dele não saem boas pautas, discussões pertinentes e abordagens sinceras. Sem formigas, um jornalista mistura-se aos ratos. Alimenta-se de restos e, por medo de bichos maiores, esconde-se em sua insignificância.

Esconde-se, porque tem medo de perder o emprego. Porque pendurou o diploma na parede para que todos o olhem e diga "Nossa, jornalista formado!". Mas esquece de cultivar suas formigas e, acomodado, aplaude a tudo que lhe é colocado. Quando não aplaude, cala-se. E um jornalista que se cala é tão inútil quanto um palhaço triste.

Em uma coisa, os jornalistas sem formigas são coerentes. Posto que não se levantam para questionar os problemas do mundo, é justo que também não questionem os seus. Trabalham sem receber, submetem-se a condições humilhantes, aceitam desculpas esfarrapadas. Não se inquietam, porque qualquer movimento brusco pode destruir seu castelinho de areia.

São, que ironia!, formigas. Trabalham a vida inteira para a cigarra. E, no inverno, dão seu abrigo a ela. Dormem no frio. Mas não reclamam. "Aqui sempre faz frio", dizem.

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